Representação do discurso outro no enquadramento teórico do género artigo científico

Autores

  • Ana Sofia Pinto Faculdade de Letras da Universidade do Porto; Centro de Linguística da Universidade do Porto

Resumo

O género artigo científico recorre frequentemente a outras vozes para legitimar o seu discurso, sendo o relato de discurso um dos principais parâmetros deste género textual. Assim, essas vozes são convocadas numa estratégia argumentativa, procurando persuadir uma determinada comunidade científica a considerar relevante uma dada pesquisa. O relato de discurso é objeto de estudo de vários autores (Swales 1986, Authier-Revuz 1982, 2008, Duarte 1999, 2008, 2020, Boch & Grossmann 2002, Rabatel 2012, e.o.), focando-se alguns destes trabalhos no discurso científico (Hyland 1999, 2002, Jorge & Luís 2018, e.o.) e, dentro deste domínio discursivo, no género artigo científico (Swales 1990, Hyland 2001, Marques 2020, e.o.). O principal objetivo deste trabalho é analisar a representação do discurso outro na secção do enquadramento teórico do género textual artigo científico. Em articulação com este objetivo geral, foram estabelecidos alguns objetivos mais específicos: a) analisar a distribuição e predomínio das estratégias de representação do discurso outro e b) verificar se estas estratégias diferem nas áreas estudadas. Para a consecução destes objetivos, constituiu-se um corpus de 30 artigos científicos (15 de Linguística e 15 de Educação), cujo plano de texto corresponde à estrutura IMRDC (Swales 1990, e.o.). Esta investigação segue uma metodologia mista que consiste, de um modo geral, na identificação das estratégias de referenciação bibliográfica e das estratégias de representação do discurso relatado no corpus. Para a análise proposta, foi tomado como referência o quadro teórico-metodológico de Marques (2020), que identifica as estratégias de referenciação bibliográfica e as estratégias de citação em oito artigos científicos, tendo em conta os artigos na sua totalidade. Quanto aos resultados desta investigação, observamos que a forma de discurso relatado mais frequente é o discurso indireto, tanto na globalidade do corpus como comparativamente. No que diz respeito às outras estratégias, a diferença não é estatisticamente significativa para se poder estabelecer uma correlação entre a área científica em que circulam os artigos e a frequência e o predomínio destas estratégias em cada um dos subcorpora. Ao nível da formatação linguística de cada uma das estratégias identificadas, verificamos a existência de alguma variedade na sua textualização, com consequências na expressão de diferentes pontos de vista do locutor sobre o discurso outroe do cumprimento dos objetivos da sua convocação, em conformidade com os resultados de outros estudos (cf., entre outros, Marques 2020).

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Publicado

2022-11-23