Dimensões da justificação no discurso legislativo uma abordagem diacrónica
Resumo
Pretendo analisar, em textos legislativos de duas sincronias da língua portuguesa, alguns aspetos da evolução observável no modo como o discurso jurídico legislativo justifica as disposições jurídico-legislativas, sobretudo quando apresentam enunciados que contêm atos de discurso com valor de justificação. Numa perspetivação comparativa e diacrónica procederei ao confronto de textos jurídicos medievais da legislação de Afonso X (como as versões portuguesas da Primeyra Partida e do Foro Real, e das Flores de Direito) com textos legislativos portugueses contemporâneos. Tentarei mostrar que nos textos legislativos medievais, além da maior extensão dos segmentos justificativos, há também uma estruturação discursiva que recorre a argumentos de autoridade. Nos textos da legislação de Afonso X é veiculada legislação régia e o Locutor, designado pela primeira pessoa “nós”, está identificado com o rei, detendo um poder inerente a esse estatuto. Não deixa de reafirmar o seu estatuto de autoridade e a conveniência da ação legislativa régia e afirma a necessidade pragmática da existência da justiça pelo seu efeito favorável que é identificado eticamente com o ‘Bem Comum’. No caso do discurso legislativo contemporâneo, é usada a 3ª pessoa e esta não designa nenhum sujeito individualizado. O direito está estabilizado, sedimentado em instituições plurisseculares e os direitos fundamentais já estão assegurados, sendo a legislação nova geralmente conjuntural e sobretudo casuística. Nas formulações legislativas contemporâneas não há um discurso de legitimação do poder e é menor a dimensão dos segmentos justificativos.
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